terça-feira, 18 de maio de 2010

Rua Padre Frederico, 12 Juiz de Fora



Nossa casa no bairro de Santa Catarina, ficava bem no acentuado da curva da rua Padre Frederico, em frente ao cemitério municipal. Próximo havia um clube, cujo acesso servia de atalho para a "rua de baixo", como chamávamos a rua dos Andrádas. Nesta rua ficavam a igreja da Glória, e a padaria onde comprávamos pão e o leite todos os dias. Era também o caminho para o Largo de São Roque, local onde eu pegava o bonde para o centro da cidade e para os bairros São Matheus, onde eu cheguei a estudar um tempo no colégio São José, e Alto dos Passos, onde moravam uns amigos dos meus pais.
Do meu quarto dava para ver da janela, os túmulos, que brilhavam nas noites de lua cheia, proporcionando um cenário digamos, um tanto macabro. Um pequeno muro cercava este cemitério. Meu pai dizia em tom de brincadeira, que não entendia para que aquele muro, se quem estava la dentro não podia sair, e quem estava fora não queria entrar. Aproveitando a claridade da lua, íamos brincar lá dentro. Confesso que hoje eu não sei se faria isso, mas, meninos não tem medo de nada quando estão em "bando".
As brincadeiras preferidas eram "pega-ladrão" e "policia-e-bandido", onde a metade era "bandido" e a outra "policia". As brincadeiras geralmente eram às noites, e aconteciam na pracinha ou dentro deste cemitério. Ninguém tinha medo. Até porque o grupo estava sempre unido. Outra brincadeira muito apreciada era empinar pipas e papagaios. Quando uma pipa arrebentava a linha, e caia dentro do cemitério, quem disse que o dono, sozinho, tinha coragem de ir lá dentro para apanhá-la.
Num desses dias de domingo, o meu pai aprontou. Pegou uma abóbora, e com um canivete passou a escupi-la de modo que parecesse uma caveira. Colocou uma boca com recortes para parecer dentes, fez as cavidades dos olhos e um buraco na parte inferior, onde colocou uma vela acesa. Depois ele a pendurou no muro do cemitério, bem na hora da saída da missa das sete, quando as beatas retornavam para suas casas. Nem precisa dizer o susto que tiveram ao ver aquela caveira ali, brilhando em cima do muro.
Na pracinha, as brincadeira eram constantes e variavam conforme a vontade da galera. Pela manhã, o preferido era o jogo de bolinhas de gude. Eu era um craque neste jogo, e colecionava uma lata de leite ninho cheia delas. A outra era empinar os "papagaios", uma espécie de pipa sem aquele rabo, porque nos papagaios eram usadas as "rabiolas" que ficavam nas laterais. Minha mãe inventou uma "senha" para que nós não esquecêssemos o horário do almoço. A senha era a carroça do leiteiro. Ela saia para pegar o leite, e dava uma olhadinha para a praça. Pronto. Quem não fosse imediatamente para casa naquela hora, teria o "couro esquentado" pelas alpargatas dela. A televisão era algo que nós não tínhamos, então a pracinha foi muito importante para as nossa horas de lazer.
Aproveitando a ladeira da rua, que era calçada com paralelepípedos, inventamos uma brincadeira muito perigosa, que por pouco não acabou em tragédia. Espalhávamos banha de porco numa madeira, fazendo com que ela deslizasse rapidamente, descendo a rua numa velocidade razoável, por causa do declive. Como era uma curva acentuada, não dava para ver se vinha algum carro subindo, e quase sempre, jogávamos o nosso "carrinho" para o meio-fio, escapando assim de sermos atropelados. Eu mesmo fui parar debaixo de um caminhão que descarregava refrigerantes para o clube. Certa vez um menino cujo apelido era Neneco, bateu com tanta violência no batente de uma calçada, que meteu a boca no chão. Durante dias se alimentou só de líquidos.
Nesta rua moravam muitos dos nossos amigos, lembro do português que colecionava gibis. Ele tinha revistas antigas do Mikey, Fantasma, Zorro e Mandrake, e sempre me emprestava alguma para eu ler. Tinha o grande amigo flamenguista filho do seu Zé, o zequinha. Era na casa dele que eu assistia ao seriado Perdidos no espaço, produzido entre 1965 e 1968, e contava a história da família Robinson no espaço, a bordo da nave Júpiter 2, com direito a Dr. Zachari Shimit, Will e seu robô. A velha lata de sardinhas enferrujada que só sabia balançar os braços e repetir "perigo!, perigo!, perigo!...
Bons tempos foram aqueles!

7 comentários:

  1. Nesta rua eu vivi momentos de muita emoção!
    Fiz muitas coisas certas, e também erradas.
    Descobri a diferença entre ser querido e rejeitado. Descobri que ter dinheiro e bom. Que não devemos roubar nada de ninguém, respeitar os horários, não faltar a escola, se agasalhar bem no frio, e que brincar muito, principalmente nas férias é bom demais!

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  2. As fotos são recentes. Na época em que eu morei lá, tinha um enorme quintal, onde hoje existe um prédio.

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  3. A vida pode e deve ser rica, independente das aquisições materiais... Tenho certeza que muitos meninos cercado de toda tecnologia dentro de seus apartamentos, ivejariam e muito a sua infância!! porque era vivida de verdade, as aventuras eram reais e não virtuais...isso sem falar nos amigos... a relação humana é tão importante para nós e está sendo deixada de lado... Deu até vontade de ir prá rua brincar!!! Vamos???

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  4. Dessa época lembro-me bem dos banhos de chuva nas bicas da casa de uma senhora bem velhinha que morava vizinho ao cemitério. Lembro de Hugo todo engessado, dos dias de enterro, etc
    Muito bom ter tido uma família igual a nossa e ter vivido uma infância especial.
    Valeu Gula

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  5. Quantas lembranças!!

    Parabéns pelo blog, tio!!

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  6. Obrigado Emanuel. Continue lendo.

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  7. Nossa! adorei o blog, nada como voltar ao bom passado e ter as mais belas lembranças das nossas infâncias. Lembro-me da rua e da casa também, ali brincavamos tanto, e da pracinha, onde aprendi a andar de bicicleta, mas saudades mesmo eu sinto do cuscuz da tia jeni, em dias frios com leite bem quente. Valeu!

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