domingo, 27 de junho de 2010

Acampados em Luziania - GO

Foi em Julho, só não lembro de que ano.
Juntamos os trocados, fizemos as compras de supermercado, quase tudo pronto para o mais desorganizado acampamento que fiz na vida.

Julho é frio. Cadê os cobertores?
Ninguém lembrou desse detalhe, e a noite só conseguimos dormir graças a jornais doados por uma senhora.

Muitos cigarros e pouca comida.
Os sacos plásticos com maços de cigarros ultrapassou em muito os de comida. Acho que a turma esqueceu que cigarro não mata a fome. Só o fumante.

Sabonete, pasta de dente, o que é mesmo isso? Ah toalhas, tá bom!
Na próxima a gente lembra disso.

Armaram um para-quedas na copa de uma árvore muito alta que havia no local.
A noite, para espantar os mosquitos, queimaram bosta de boi, dentro da barraca. Deu certo, os mosquitos foram embora. Eles e nós. Porque ninguém conseguiu ficar lá dentro sem passar pela experiência da morte por asfixia.

Essa desorganização durou três dia. No último dia, tivemos que escolher entre o pão e as passagens de ônibus para voltar.

Quando chegamos na manhã de sexta-feira, tudo era alegria. Corre-corre para cair nas águas geladas do lago artificial que existia em Luziania. Na beira deste lago, montamos acampamento. Ninguém tinha carro nesta época, então o acampamento foi planejado para ficar perto de um bairro que tivesse tudo. Só que lá não havia nem bairro, muito menos tudo. Ao cair da tarde, é que fomos pensar em armar o para-quedas que serviu de barraca para todos. Éramos oito e até que deu para acomodar todo mundo. A noite, porém, tivemos que procurar jornais pelas redondezas pra gente poder dormir, por que ninguém aguentava o frio. Fizemos uma fogueira e passamos a primeira noite acordado. Lembro que fizeram café umas dez vezes nesta noite. O pó acabou.

11h Resolveram atravessar o lago a nado. Quase morri. Quando achei que estava raso, deixei que meus pés tocassem o fundo do lago. Era pura lama, e eu afundei nela. No desespero, sai juntando as últimas forças que me restavam, e desmaiei em solo firme.
Algumas meninas de Luziania apareceram no sábado. Elas me apelidaram de Tony Ramos.
Fizemos uma festinha com elas até o entardecer.

Esconderam os cigarros. O desespero caiu sobre os fumantes.
Depois de muita tortura, acharam os culpados.

A noite, já escaldados pela experiência do dia anterior, acendemos uma fogueira do lado de fora da barraca, ela espantava os mosquitos, e nos proporcionou uma noite melhor que a anterior. O frio já não era tanto graças aos jornais, que também tiveram outra serventia. Começava mais um dia. Sem café e sem pão. Preparam uma mistura de ovos com salsichsa que estava ruim demais para comer.

Sem dinheiro, resolvemos voltar ainda na manhã daquele domingo.
Marcaram uma reunião a tarde, para tratar do próximo acampamento.
Ninguém compareceu!

Rua Dr. Oscar Vidal - Juiz de Fora

O trabalho voluntário executado pelos meus pais na paróquia da Glória, teve um aspecto social muito importante, pois agora o nosso ciclo de amizades estava mais aberto, e não só restrito à rua onde eu morava. O casal Pimenta, passou a fazer parte da nossa vida, e foi sem dúvida alguma, bons momentos aqueles que passei na companhia deles. A familia morava na Rua Dr. Oscar Vidal, no centro de Juiz de fora, e vez por outra era convidado a passar o final de semana com eles. Os filhos deste casal, passaram a ser grandes amigos, e seus apelidos Huguinho, Zezinho e Luizinho, fui eu quem colocou em homenagem aos sobrinhos do Tio Patinhas, que eles tanto gostavam de ler. Às vezes fico recordando aquele momentos de alegria e de brincadeira que vivemos. Logo na primeira vez que fui convidado para um almoço na casa dos Pimentas, fiquei muito acanhado mas eles eram tão educados, que ao perceberem minha timidez, trataram logo de puxar conversa e a mostrar coisas interessantes, como a coleção de gibis os álbuns de figurinhas e a mesa de ping-pong, que alias, foi onde passamos o resto daquela tarde jogando.
Em outras visitas, sem muitas cerimônias, pois já os conhecia, passei sair com eles para conhecer outras crianças e a participar das brincadeiras de rua praticadas por eles. Era comum ver grupos de criança descendo a ladeira da Oscar Vidal com seus carrinhos de rolimãs, cada um mais incrementado que o outro, e chegava a uma velocidade incrível, ajudados pela geografia da rua. Era normal ver acidentes acontecendo com os pilotos nesta brincadeira. Eu mesmo perdí o controle quando fazia a descida em uma destas "ferraris". Quando tentei freiar, quebrei a alavanca e tive que usar o freio pedal, ou seja, meter o pé no cimento. Só parei quando meti a fuça numa lixeira de borrachas que estava na frente de uma das casas. Lembro que foi lixo espalhado para todo o lado. A senhora xingou muito e fez eu pegar um por um todo o lixo que deixei pela rua devolvendo tudo a lixeira. O resto da galera riu muito nesta manhã.
Outra brincadeira que participei, foi a dos pneus. Apanhávamos os pneus velhos em alguma borracharia e com um pedaço de pau, íamos tocando eles rua abaixo. Verdadeiras manobras eram feitas com estes pneus. Quando queríamos fazer uma curva mais brusca, forçávamos o pneu para o lado com a madeira, até que ele deitasse e fizesse a manobra completa, então voltávamos para a posição normal. Tudo era feito com muita perícia e velocidade, com a gente correndo atrás deles. Acontece que nem sempre tudo sai exatamente como fora calculado, então os acidentes vez por outra aconteciam. O mais comum era perder o controle deste possante veículo,deixando que despencasse, pulando ladeira abaixo, e destruindo tudo que encontrasse pelo caminho, inclusive jarros de plantas, lixeiras, cadeiras entre outras coisas, só parando quando batia em algum carro que estivesse na hora, trafegando na movimenta avenida Barão de Rio Branco. O motorista acidentado bem que tentava encontrar o culpado pelo acidente, mas ao olhar para cima podia ver que estava diante da rua mais pacata de Juiz de Fora, e que teria de arcar com o seu prejuízo sòzinho. Nenhuma criança ousou sair mais de casa neste dia.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Padre Frederico - continuação

O bairro Santa Catarina, foi um dos melhores lugares que eu morei até hoje. Com dez anos, eu curti muito esta mudança. Na primeira vez que entrei na casa, fui reparando nos cômodos, no tamanho da sala, na posição dos quartos no corredor, até parecia que eu já havia morada por la. Um lugar que eu gostava muito, era a varanda que ficava nos fundos, logo depois da porta da cozinha. De lá se avistava o bairro de Lourdes, lembro que quando era dia da padroeira, a gente podia ver as luzes das velas dos fiéis iluminando a procissão. Uma pequena escada de cimento, dava acesso ao quintal e ao quarto de dispensa. Esse quintal era uma maravilha. Além de grande, tinha outro lote vazio que descia até a outra ponta da rua, onde terminava num grande muro de placas de cimento. Ali crescia o mato, e sobrava para o meu pai, a árdua tarefa de limpá-lo. Na parte de cima, no recanto do muro, havia um lote de pés de bananeira, que fazia sombra para as nossas brincadeiras. Neste recanto ficava as rodovias por onde circulavam os nossos carrinhos de brinquedo. Em frente a varanda que ficava na frente da casa, tinha um jardim com uma planta arredondada, espinhenta e comprida, que completava o visual da fachada. Na lateral oposta ao quintal, tinha um beco estreito, que fazia toda a extensão da casa, e acabava nos degraus em frente ao quarto de dispensa. Neste canto funcionava a minha fábrica de brinquedos. Com o martelo e um serrote cego, eu construía ali, meus caminhões, máquina de enrolar linha, e armas de brinquedo que faziam o maior sucesso. Eu fabricava as balas de pau, que seriam disparadas com a ajuda de um pedaço de borracha de câmara de ar. O gatilho era de arame, e servia para liberar a bala que ficava apoiada no cabo do revolver. Algum irmão deve se lembrar da dor que estas balas provocavam quando acertavam agente.

Frequentando a praça da rua, começamos a fazer amigos.

As amizades foram começando devagar, e em pouco tempo já tínhamos uma rua inteira de amigos. As brincadeiras eram frequentes e aconteciam sempre nesta pracinha, ou nos terrenos baldios que naquela época existiam em grande quantidade. Também nesta rua ficava o cemitério. A gente assistiu a enterros de muita gente desconhecida. Ficamos acostumados com este ritual, e até usávamos o lugar como atalho para irmos a igreja.
Nossa brincadeira preferida nas férias, era empinar pipas, ou papagaios, como era chamada a pipa quadrada com enfeites laterais. Milhares destes papagaios podiam ser vistos colorindo o céu de Juiz de Fora. Para cada papagaio empinado, existia um grupo de meninos que ficavam ali apreciando as manobras aéreas e os cruzamentos com as outras pipas. Antes destes papagaios ganharem o céu, era preciso preparar o cerol que seria usado na linha. Para que o cerol ficasse bom, era preciso moer os cacos de vidro, até virarem pó. Era comum avistarmos nas linhas dos bondes, uma caixinha de fósforo sendo esmagada. Nestas caixinhas eram colocada os cacos de vidro de lâmpadas e depois era colocada nos trilhos. O melhor cerol era feito com estes procedimentos. Com técnica e um bom cerol, nós garantíamos a nossa pipa no céu por mais tempo.
A amizade de meus pais com os padres, os levaram a participar do Movimento Familiar Cristão, que era realizado na paróquia da Glória, onde aconteciam as reuniões duas vezes na semana. Este movimento consistia na ajuda onde casais experientes, transmitiam toda a sua experiência para outros que passavam por alguma necessidade, tanto financeira, ou mesmo desavenças familiar. Estes casais recebiam ajuda como leite em pó, que era doado por instituições norte americanas, eu me lembro que chegava lá em casa um monte de sacos com este leite, ou simplesmente recebiam uma ajuda com atos, ou palavras de conforto espiritual. Pelo menos uma vez por semana, o padre Jaime estacionava o seu jeep na porta da nossa casa, para apanhá-los. Cabia a mim, a missão de tomar conta dos meus irmãos nestas noites de ausência paterna. Lembro que o trabalho não era fácil. Colocar a galera para fazer os deveres de casa, conferir cada tarefa uma-a-uma, e depois dos dentes escovados colocá-los para dormir. Numa destas noites, caiu uma tempestade daquelas. Parecia o fim dos tempos. Relâmpagos iluminavam a nossa casa, e expunha com seu brilho tenebroso, as cruzes brancas dos túmulos, lá no cemitério. O cenário era macabro. Eu pedia para todos ficarem quietos que logo tudo passaria, mais eu mesmo era talvez o que estivesse com mais medo. Para piorar, faltou luz. Ai o caos ficou completo. O chororô foi geral. Minhas irmãs se atiram pra debaixo da cama, e eu só via os olhinhos brilhando com as lágrimas por causa dos clarões dos relâmpagos. No tato consegui encontrar velas e fósforos, aliviando assim a tensão. Aos poucos o temporal foi se dissipando e o sono caiu sobre todos. Meno para mim, que continuava morrendo de medo, olhando para aquele anão sentado na mesa da sala. Era o que parecia a farda que meu pai deixou no encosto da cadeira, que com o efeito das chamas das velas parecia se movimentar. Pouco depois o jeep chegou, e meus pais ao entrarem em casa, encontrou todos dormindo o sono dos anjos.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Um passeio ao Rio de Janeiro

Uma ferida apareceu bem no meio da minha canela. Era feia que doía, e não sarava de jeito nenhum. Formava uma casca grossa e escura, eu coçava e ela caia, depois sangrava, criava casca e começava tudo de novo. Isso foi no ano de 1966 eu ainda iria completar 11 anos, e meu pai trabalhava no Hospital Central do Exercito, no Rio de Janeiro. Nós morávamos em Juiz de Fora com mamãe, e ele todo final de semana vinha nos visitar. Para tirar o dinheiro da viagem, ele levava de Juiz de Fora, meias para vender no Rio, e do Rio ele trazia umas linguiças para vender em Juiz de Fora. Num final de semana desses que meu pai nos visitava, minha mãe conversou sobre esta ferida, e convenceu o meu pai a me levar para o Rio com ele, para eu ser tratado no HCE. Então eu passaria a semana toda com meu pai lá no Rio. Tudo acertado, lá vai eu e papai às cinco horas da manhã, descendo as ladeiras de Juiz de Fora à pé, rumo a estação rodoviária, para pegar o ônibus para o Rio. Mais uma vez eu me encantava com a estrada Rio-JF, aquelas serras, os rios que nos seguiam pela viagem, era tudo muito bonito. Ainda hoje estas paisagens me enchem os olhos. Quando chegamos no Rio, fomos direto para o bairro de Triagem, onde fica o HCE. Meu primeiro dia, foi dentro deste hospital. O médico examinou a ferida, os enfermeiros fizeram uma limpeza que doeu para cassete, e colocaram umas pomadas e depois enfaixaram. Pronto. Estava tratado e com uma faixa branca na perna. À noite, meu pai me levou para Bento Ribeiro, onde morava um amigo de trabalho. Lembro dele, muito gente boa, sua família me recebeu como se eu fosse seu próprio filho. Neste dia assisti um programa de humor na TV, e fui dormir ainda com dor, devido ao tratamento da perna. No dia seguinte, quando acordei, papai já havia saído para o trabalho, eu fiquei meu sem jeito, mais o filho deste senhor, me chamou para descer e brincar na rua com outros amigos seus. A manhã passou rapidinho e na hora do almoço, papai me falou que não ia trabalhar de tarde, para a gente poder dar uma volta pela cidade. Passeamos de ônibus, por vários lugares do Rio. Lembro da passagem por São Cristóvão, depois pelas praias de Botafogo, Flamengo e por fim Copacabana, onde sentamos num bar que ficava virado para o mar, no posto 6. Meu pai tomava chopp e eu guaraná Antartica. No som do bar tocava a musica Michelle dos Beatles, e em seguida, Que tudo mais vá pro inferno, de Roberto Carlos. Esta eu ouvi pela primeira vez, la no Rio. De frente para o mar, e sem poder entrar na água, pedi a papai para me deixar andar na areia. Meu pai disse que não, por causa do curativo. Mais mesmo assim, eu insisti, e ele me deixou por os pés na areia, só para matar a vontade. Esta semana passou muito rápido. Voltamos para casa, e até hoje ainda tenho no meio da canela da perna esquerda, as marcas desta ferida.
Neste tempo, meu pai pensava em nos levar para morar no Rio. O problema era o prêço dos aluguéis. Tenho a lembrança dele conversando sobre isto com mamãe. Mais meu pai não desistiu da idéia e continuou procurando uma casa para a gente morar. Uma vez ele foi convencido a entrar num empreendimento imobiliário,que estava sendo construído em Paciência, um local bem distante do centro do Rio. Eu cheguei a ver o local ainda em construção. Não sei como meu pai imaginava colocar todos nós naquela construção tão pequena, que mais parecia um pombal.
Era assim: Uma minúscula sala, um banheiro muito pequeno, uma cozinha que praticamente ficava embaixo da escada que dava acesso aos dois quartos lá em cima. Tudo muito pequeno, nem espremendo daria para a gente morar. Mas, o construtora faliu, o negócio não foi pra frente, meu pai amargou um prejuízo, e nosso destino não foi alterado, graças a Deus. Fico imaginando se por acaso, tivesse dado certo. Um dos meus irmãos seria jogador profissional, e hoje estaria talvez treinando um time lá pelas Laranjeiras.Outro seria líder comunitário, e estaria administrando a campanha para vereador. Uma irmã trabalharia na agência Paciência, de algum banco. Será que alguma delas viraria uma passista de escola de samba? Qual delas escreveria contos retratando personagens do bairro? Quem será que iria preparar uma feijoada bem gostosa nos finais de semana? Quem já estaria aposentado? Sei lá! Melhor eu ir logo pegar as cervejas.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

História e molecagens

1

Uns meninos que moravam na quadra, fizeram um boneco de pano com 1,50mt, igual ao "judas" das malhações de sábado de aleluia. Subiram com ele até o teto do bloco, isso à noite. As pessoas la embaixo, assim que repararam aquele vulto lá em cima, imaginaram logo se tratar de um suicida que estava prestes a se atirar lá de cima. Começou então uma gritaria, um desespero para tentar evitar a tragédia. Gente pedindo pelo amor de Deus, para que "ele" não pulasse. Que a vida era bela, para ele não fazer bobagem etc.. etc.. Os meninos então, indiferente aos apelos, jogaram o boneco lá de cima, então, as pessoas apavoradas, começaram a gritavar sem parar, algumas correram para longe com medo, outras tentaram socorrer o "suicida", que tinha despencado. Quando descobriram a farsa, olharam para cima e viram só as cabecinhas dos moleques se acabando de rir. Foram todos apanhados pelos porteiros. Uma senhora idosa, sentiu-se mau. Muitos apanharam dos pais naquele dia. Alguns, de quebra ficaram meses de castigo, sem poder descer para brincar depois das aulas.

2

Existia a famosa bola "perereca", feita com uma borracha sintética especial, que fazia com que a pequena bola pulasse mais que as comuns. Esta bola preta e muito pesada, foi moda na década de setenta. Quando atirada ao chão, ela subia na mesma velocidade que descia, e com muito efeito. Uma vez, eu atirei uma destas bolas, do vão da escadaria do prédio onde morava, do quinto andar. Resultado: A bola desceu, bateu na quina de piso, se desgovernou, e na velocidade que veio, acabou quebrando os vidros da portaria que ficaram estilhaçados e espalhados pelo chão. Até então ninguém sabia dizer quem teria quebrado aquela vidraça.

3

Um casal de namorados, se sentava todas as noites no mesmo banco do parquinho do bloco K, e ficavam ali se beijando e se agarrando por um bom pedaço da noite. Eu mais uma turma, compramos umas bombinhas e colocamos o pavio num toco de cigarro aceso. Bem devagar e sem sermos percebidos, colocamos a bomba por traz do banco em que eles estavam sentados. Logo que a brasa atingiu o pavio, a bombinha explodiu.
Resultado: Foi uma gritaria, um corre-corre, o macho do namorado desmunhecou e gritou feito gay angustiado. A menina desapareceu aos prantos. Nunca mais os dois foram vistos namorando embaixo do bloco.

4

Enchi vários balões daqueles de festa de criança com água, e fiquei no meu quarto esperando as vitimas passarem por debaixo janela. Quando elas apareciam, eu soltava os mísseis tentando acertar na cabeça delas. Mesmo errando o alvo, o susto era enorme quando os balões estouravam jogando água pra todo lado. Lembro de uma vez que uma menina, muito bem arrumada estava abrindo a porta do carro para sair. Pelos trajes, podia-se imaginar que iria a uma festa. Acertei ela em cheio.
Resultado: Acho que nem precisa falar muito o que aconteceu. Muito choro e muitos palavrões. Coitada da minha mãe! Nesse dia ela não virou santa por pouco!

5

Um dia, uns meninos apareceram oferecendo bolo confeitado e guaraná antártica tipo caçulinha, dizendo eles que era de uma festinha de aniversário que estava acontecendo no outro prédio. Rapidamente aceitamos e comemos tudo até o último pedaço. Por causa do lanche, estes meninos fizeram o maior sucesso. Jogaram com a gente, dentro da maior diplomacia. Viram heróis naquela noite. Depois ficamos sabendo que eles tinha apanhado a guloseima, de uma macumba que alguém colocou na entrada da quadra.
Resultado: Passei muitos dias sem poder nem olhar para bolos de chocolate com recheio branco.

6

Para encerrar este bloco, vou relatar aqui a mais maldosa de todas as brincadeiras de mau gosto, de que tenho lembrança. Havia um garoto chato pra caramba, que ninguém gostava de brincar com ele. Então, certo dia eu e um amigo, estávamos voltando do colégio, quando passamos pela obra de um prédio que estava em construção na quadra 106. Lá haviam muitos buracos, que serveriam para a base onde seriam erguidas as pilastras do edifício. Eram grandes mesmo. Ficamos certos de voltar algum dia para explorar aqueles buracões. Dito e feito. No dia que resolvemos ir a obra, encontramos o chato do cara embaixo do prédio. Ele nos seguiu até o local onde ficavam os buracos da obra. Nem ligamos para ele. Quando chegamos, nos certificamos que não havia nenhum vigia para encher o saco. Depois de posse de uma escada que apanhamos ali mesmo, começamos a descer até o fundo de um dos buracos. Era de dar medo. A gente olhava para cima, e via aquela bolinha de azul no céu. E nós lá embaixo na escuridão. Matada a curiosidade, subimos e já estávamos saindo da obra, quando vimos que o moleque tinha resolvido descer também. Na mesma hora, resolvemos voltar para ver. O meu amigo, quando viu o cara lá embaixo, depressa me chamou para ajudá-lo a retirar a escada, que eu lembro, que era bem pesada. Retiramos a escada, e o moleque ficou lá embaixo, sem ter como sair. Ele começou a chorar, e pedir desesperadamente, para a gente colocar a escada para ele poder subir. Então começamos uma série de chantagens.
- Só se você disser que é bobão.
- Só se você nunca mais seguir a gente.
- Só pagando uma coca-cola...
etc..etc.. e por ai foram um monte de asneiras seguidas. E o moleque chorando.
Chorou mais ainda, quando a gente fingiu que ia embora.
Claro que colocamos a escada de volta para ele poder sair.
Depois que ele subiu, bateu em disparada fugindo da gente.
Durante dias ele nem quis saber de chegar perto da nossa turma. Levou muito tempo, até que a gente esquecesse o que aconteceu naquele dia.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

Brasília - Natal a viagem.

Estava a muito tempo alimentando a vontade de passar uns dias em Natal para rever a família e matar saudades do mar que não via há tempos. Aproveitei o dinheiro que recebi de indenização para comprar as passagens, e logo após as festas natalinas, embarquei num ônibus da viação Planalto na noite do dia 26 de dezembro do ano de 1971. Eu tinha consciência do tempo da viagem que seria de mais ou menos trinta e oito horas e também do péssimo estado em que se encontravam as estradas nas quais teria que passar. O embarque foi divertido e demorado pois alguns destes passageiros carregavam uma verdadeira mudança. Foi um custo acomodar tantas caixas, malas, sacolas e até um fogão novinho em folha, no compartimento de bagagens. Nossa partida atrasou em quase meia hora.
Na madrugada já estávamos sofrendo as consequencias da buraqueira. Era só o começo. Haviam trechos sem asfalto e com barro mole por causa das chuvas que caiam com frequencia nesta época do ano. Essa lama fazia o nosso ônibus tombar de um lado para o outro numa barulheira de molas que doía nos ouvidos. Para piorar a situação, do meu lado viajava um paraibano que estava retornando para a sua terra, depois de ter trabalhado cinco anos em Brasília. Este cidadão a cada parada que o ônibus fazia, tomava umas pingas e depois caia no sono. Vez em quando ele despencava por cima de mim, e eu tinha o maior trabalho para colocá-lo de volta a sua poltrona. E o bafo! Mais isso era detalhes.
Minha maior curtição era observar as mudanças que iam acontecendo na paisagem. Primeiro foram as árvores tortas do cerrado, depois, já em minas, eram as matas nas encostas das serras e os rios que apareciam de vez em quando dando um colorido maravilhoso a viagem. Amanhecemos em Montes Claros ainda em Minas Gerais, onde tomamos o café da manhã. Depois seguimos para a cidade de Teófilo Otoni onde jantamos e fechamos o primeiro dia da viagem.
Tentei dormir esta noite mais foi impossível. O ônibus passava por um trecho muito esburacado e com curvas acentuadas. Foi terrível. Não conseguí pregar os olhos um instante sequer.
Como é grande Minas Gerais! Não sei ao certo quantas horas nós levamos cortando este estado. Curvas, serras, neblina e rios que tocavam suas margens na beira da estrada, dava o toque especial a paisagem. Isto é Minas. As BRs que recortam o estado, estão entre as mais perigosas do país. As que carregam maior índice de acidentes, porém, são as que tem as paisagens mais bonitas. Impossível viajar por Minas sem se encantar.
De repente o nosso veículo entrou num cenário maravilhoso. Um por de sol inesquecível deixou o céu avermelhado na divisa entre os estados de Minas Gerais e Bahia. Estávamos rumando para a cidade de Vitória da Conquista, onde faríamos uma parada demorada. Decidi que eu procuraria um local para tomar banho pois eu já me sentia incomodado com quase dois dias de sujeira e com aquele calor só fazia aumentar. Nesta cidade chegamos a noite, não lembro bem que horas foi exatamente mais já era tarde. Paguei caro por um banho que valeu a pena, jantei e quando encaramos a estrada novamente, cai no sono com vontade.
Quando amanheceu, estávamos deixando pra trás os montes de pedra típicos da chapada diamantina. Uma curiosidade neste local era os leitos dos rios sem água, e também as enormes aranhas caranguejeiras que vez por outra podiam ser vistas atravessando a BR.
A paisagem foi mudando novamente. Apareceram os açudes, as cercas de pau entrelaçados bem típico do nordeste, e a cor da areia mudou de avermelhada para branca. Começou a aparecer gente na beira da rodovia. Muitas crianças só de calção, alguns com pás, fingiam que tapavam buracos no asfalto, para pedir comida e dinheiro. Neste momento o ônibus se arrastava por causa do péssimo estado de conservação. É pena saber que quase quarenta anos depois esta cena se repete. Pouca coisa mudou.
Entramos na Paraíba. Na cidade de Pombal, felizmente o meu companheiro de poltrona desembarcou. Na despedida ele me ofereceu um copo pela metade de cachaça e disse que eu não deveria rejeitar, pois ali onde ele morava, isso era considerado uma grande desfeita e gente morria por isso. E eu, que não queria morrer tão cedo, tomei tudo de uma golada só.
Passamos num vilarejo cheio de bananeiras, e que mais parecia um enorme quintal. Uma maravilha de lugar que marcou esta viagem. Não sei o nome da vila, só sei que era muito bonito. Não tinha asfalto, a estrada era de barro batido e o ônibus circulava entre as folhas desta bananeiras que produziam sombras no local. Ali, crianças brincavam e tomavam banho junto com galinhas, bodes e vacas magras que matavam a sede na beira deste açude.
Horas depois estávamos em Campina Grande. Foi uma parada demorada. O motorista mandou que todos descessem e o veículo foi levado para a garagem onde foi abastecido e lavado. Quase uma hora depois seguimos nossa viagem num veiculo vazio e sem cheiro ruim no banheiro.
Duas horas depois estava dentro de um táxi em Natal, seguindo para a rua São João, onde moravam os meus avós.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

306 norte - continuação


O meu quarto era invadido por luzes que refletiam no teto deixando uma aparência azulada em todo o cómodo. Estas luzes eram provenientes de um posto de gasolina que funcionava vinte e quatro horas e que ficava na rua que dava acesso a entrada da quadra. Nas noites quentes e secas de Brasília, incomodado pela invasão de mosquitos, que entravam em bandos pelas janelas, algumas vezes sem sono e ficava observando o movimento naquele local. O posto, nos finais de semana, era ponto de encontro da rapaziada que paravam seus carros ali, ligavam o som no último volume, acordando um bocado de gente. Uma vez, me lembro de um sargento que saiu para reclamar, e provocou um verdadeiro tumulto no local, sendo necessário a presença da polícia para acalmar os ânimos.Sair cedinho para a padaria, já era uma tarefa minha. Atravessava a W3 vazia, para comprar pão e dois litros de leite da marca Gogó, pasteurizado e embalado em saquinhos de plástico, bem diferente do que tomávamos em Juiz de Fora, entregue de carroça pelo leiteiro, em garrafas de vidro. Meu pai dizia que cada dia ele, o leiteiro, misturava mais água ao leite. Era só brincadeira, crescemos tomando aquele leite, sem nenhum problema. Em 1968 a W3 era tão vazia, que por vezes organizávamos as nossa “peladas” ali, bem no meio da rua, pois quase não tinha movimento de veículos. Quando aparecia um carro, interrompíamos o jogo deixando o veículo passar, depois continuávamos novamente. Tento imaginar estas cenas nos dias de hoje. Seriamos todos atropelados, pelo progresso.Um acontecimento muito importante para nós, foi quando montaram um parque de diversões do outro lado da rua, bem em frente a nossa quadra. Era uma oportunidade ímpar, pois divertimento, em Brasília nesta época, era algo raro. À tardinha, antes do anoitecer, de banho tomado e bem arrumados, atravessamos a rua para conhecer o lugar. Mamãe estava conosco, e era ela quem comprava os ingressos para os brinquedos. Uma espécie de barca de madeira que subia e descia carregada de gente, era a mais concorrida muita gente curtia a brincadeira, tinha também o trem fantasma, o carrocel e a roda-gigante. Mas a minha barraca predileta era a do tiro-ao-alvo. Uma espingarda velha e quase sem pressão disparava rolhas desgovernadas, que saiam do cano em zig-zag e sempre erravam a mira. Eu reparei que algumas pessoas colocavam tachinha na rolha para elas ficarem mais pesadas, o que melhorava a pontaria. Fiz isso e deu certo. Minhas irmãs ganharam bichos de pelúcia neste dia.Dois anos passaram rapidamente e tivemos que trocar de bairro. Foi uma despedida dolorosa, pois todo nós estávamos bem acostumados com a convivência nesta quadra. Os amigos, as brincadeiras, a namorada, e a escola, tudo isso foi ficando para trás. Mudamos em fevereiro de 1970, e eu só retornei para uma visita breve ao amigos, no mês de maio, quando fui na bicicleta que ganhei de aniversário. Eu, acompanhado de outros dois amigos, pedalamos do setor militar até la, pegando atalho pelo mato, onde hoje fica o autódromo, e o departamento de transito do distrito federal. Dei uma volta completa, revi amigos e retornei mais tarde, feliz da vida. Foi a última vez. Não lembro de ter voltado por lá naquele ano. As visitas foram ficando cada vez mais raras, a medida que os meus amigos se mudavam. O ano passava rapidamente, e em meados de setembro, recebemos a visita do major Jorge, chefe do serviço de embarque, e consequentemente, chefe do meu pai. Ao ser apresentado a este senhor, sem nenhum constrangimento, pedi a ele que me arranjasse um emprego. Ele prometeu e cumpriu. No dia dezessete de novembro deste mesmo ano, ainda com quinze anos de idade, começava a carreira de office-boy na empresa de mudanças As Preferidas, de propriedade do Sr. Júlio, com sede no Rio de Janeiro e com filial em algumas capitais do país. O meu serviço não era lá estas coisas todas, e eu ganhava só a metade do salário mínimo. O escritório ficava na Galeria Amazonas, no Setor Comercial Sul, no centro da cidade. Lá eu lavei banheiros, o vidro da entrada, varria os tapetes, e fazia serviço externo como pagamento bancário e serviços de cartório, entre outras coisas. O gerente Sr. Aloisio, comprou um manual de datilografia, e sugeriu que eu treinasse nas horas de folga. Em pouco tempo eu já sabia escrever nas máquinas eletricas, as mais modernas que haviam. Este gerente, demonstrava que gostava de mim. Sempre tentava de um jeito ou de outro me ajudar, porém eu era muito tímido, e isso me atrapalhava um pouco. Eu tinha vergonha de quase tudo. Até de almoçar com eles. Quando era convidado, arrumava sempre uma desculpa para não ir. Meu almoço por muitas vezes, era um copo de vitamina com pão e manteiga. Não que eu não tivesse o dinheiro do almoço, mais era por pura vergonha de me sentar a mesa nestes lugares.Morria de medo de “pagar um mico” na frente dos outros. Mas aos poucos, fui vencendo a timidez, e antes mesmo de completar um ano como office-boy, fui promovido para um trabalho externo, que consistia em fazer a vistoria dos móveis na casa dos clientes. Junto com meu instrutor, o Luiz Augusto, fui aprendendo a técnica de calcular a metragem dos móveis que seriam transportados, assim como definir o tipo de embalagem ideal para cada um deles. Quando o dono da empresa, Sr. Julio, desembarcou em Brasília para uma visita técnica, onde pretendia abrir uma filial na cidade de Goiânia, fui convidado para compor o grupo que visitaria aquela cidade. E assim, confortavelmente sentado no banco dianteiro do Dodge Dart prêto, viajei com eles para o Goiás. Quando cheguei em Goiânia, lembro até da musica que tocava no rádio do carro. Have You Ever Seen The Rain, do Credence. Gostei tanto desta cidade, que ainda hoje, sempre que posso, aproveito por la o final de semana.