domingo, 25 de abril de 2010

Viagem pelo atlântico - Recife

As obras de construção do atual porto do Recife só tiveram início em 1909, sendo inaugurado em setembro de 1918. O primeiro vapor a atracar foi o paquete São Paulo, pertencente ao Loyde Brasileiro. Com o desenvolvimento da navegação o porto do Recife tornou-se palco de variadas atrações, onde a sociedade parava para assistir o embarque e desembarque de turistas, famílias de emigrantes, marinheiros, estivadores, vendedores, ambulantes e homens de negócios, e se divertir com a chegada dos primeiros navios a vapor, os transatlânticos e paquetes estrangeiros, todos enfeitados com bandeirolas, e que, quando cruzavam a barra, toda a cidade era avisada através de tiros de canhões emitidos pelo Forte Quebra–Portas. Eles aportavam em ritmo de festa, ao som da Banda da Policia Militar, instalada em palanque armado no pátio do Arsenal da Marinha.


Uma tempestade de pequenas proporções nos surpreendeu durante a viagem para Recife.

Chovia e ventava muito. O mar ficou agitado e o navio balançava de um lado para o outro. Subia e descia num movimento frenético, enquanto eu deitado em uma das camas, me divertia vendo a água da chuva batendo forte na escotilha do camarote, desenhando rastros no vidro. A amiga da minha mãe que viajava conosco, se acabava em vômitos e choro. Um grito dentro da cabine. A porta do banheiro esmagou o dedo de um dos meus irmãos. Mais choro. Minha mãe estava desesperada. Meu pai saiu correndo para buscar socorro. Um marujo enfermeiro chegou vestido de branco e azul, e "arrumou a casa".

Chegamos à Recife no final da tarde. Acho que o navio pesou só para um lado, porque todos estavam na grade de proteção do convés, admirando a beleza da cidade, enquanto os procedimentos de entrada no porto eram realizadas pelo "pratico", um pequeno barco que guia a entrada dos navios no porto.

Alguém que trabalhava na cozinha do navio, nos trouxe à noite, uma panela enorme cheia de cuscuz com leite e açúcar. Depois de esvaziarmos esta panela, dormimos tranquilamente. Nesta noite o navio não sacudiu tanto porque estava nas águas calmas do porto.

De manhã ainda chovia, porém com pouca intensidade.

No café da manhã nos foi servido um minguau de maizena com canela. Uma delícia.

Meu pai aportou. Saiu para dar uma volta pelas redondezas do caís, e algum tempo depois retornou com um monte de coisas que ele havia comprado nos armazéns próximo ao porto.
Lembro bem dos carrinhos de ferro que ele trouxe para cada filho, e um de bonecas para a minha irmã. Lá no convés, os carrinhos iam de um lado para o outro acompanhando o movimento do navio. Em dado momento, o carrinho de um dos meus irmãos despencou por um buraco entre os botes salva-vidas e foi parar nas águas do atlântico. Para tentar recuperar o brinquedo, meu irmão quase caiu também.
Depois do almoço, fiquei curioso por conhecer a parte de baixo do navio. É que os camarotes estavam um pouco acima, e eu via lá embaixo, o movimento de pessoas. A curiosidade falou mais alto e eu fui ver o que não conhecia da embarcação. Não me lembro quem estava comigo, nem se eu sai escondido ou com permissão dos meus pais, só sei que tinha mais alguém comigo. Na parte de baixo, havia passageiros também. Só que era horrível o lugar. Depois fiquei sabendo que tratava-se da "terceira classe". Pessoas que pagaram mais barato pela passagem. Ainda bem que meu pai não economizou.
Neste passeio cheguei a ponta do navio. A proa. Me segurei nos ferros que havia por lá, e me debrucei para ver o redemoinho que se formava quando o casco do navio batia nas águas azuis, formando um linda e enorme espuma branca. Lembro muito bem da vertigem que eu senti nesse momento. Parecia que a água me chamava. Foi uma sensação ruim. Saí rapidamente daquele lugar.
A tarde estava linda e ensolarada. A chuva se foi.
Fizemos outro lanche gostoso no restaurante. Dessa vez foi torradas, chá e café. De noite levaram uma sopa de macarrão para as crianças, e os adultos comeram um peixe no restaurante. Eu sei, eu estava entre eles.

Na saída de Recife, um contratempo. Aguardar a maré encher para seguir a viagem. O "pratico" foi embora e nós ficamos ancorados ali, apreciando a vista da cidade, por um bom tempo.


4 comentários:

  1. Recife foi a primeira cidade que eu avistei do mar. Naquela época já era grande e cheia de prédios. A chegada foi tumultuada, mais o tempo de permanência foi gratificante. Ficamos mais de 24h. neste porto.

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  2. Ai, Gulla, parece que eu também estava lá!! consigo visualizar cada cena! estou descobrindo também porque acho tão gostoso cafe com leite e cuscuz... tá no DNA... longa vida para essa viagem... tomara que ela dure ainda muitas páginas!!!

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  3. Voei no tempo, que memoria a sua, lembra dos detalhes, lendo agora tambem revivi aqueles dias. Mas fala serio, aquele minguau de maizena ninguem merece né. ficamos proibidos de comer no restaurante por causa da bagunça que faziamos.

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  4. hahaha... o texto é fantástico tio! Eu nem tava perto de nascer, sabia por alto da história, mas agora estou fascinado! Adicionei o blog nos favoritos e ja estou ansioso pra saber o resto da viagem!
    Muito legal!
    Abração!

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